
FOTO: Joadson Silva (ONG Seridó Vivo)
O Relatório Anual do Desmatamento (RAD), divulgado pelo MapBiomas, revelou que, em 2023, o Rio Grande do Norte foi um dos estados com maior aumento percentual no desmatamento. Os dados, que comparam os anos de 2022 e 2023, mostram um aumento de 161% em um ano: foram 9.135 hectares desmatados em 2023 no RN – desses, sendo quase 9.114 na Caatinga potiguar –, recorde desde o início da medição realizada pelo RAD, em 2019. O que ainda chama atenção é que o RN desmatou 1.369 hectares para energias renováveis na Caatinga em 2023, sendo o estado com mais desmatamento para essa finalidade.
De acordo com informações extraídas da base de dados do MapBiomas, em 2022 foram 290 hectares desmatados na Caatinga no RN pelos empreendimentos de energias renováveis. O número, que subiu para 1.369 em 2023, mostra um aumento percentual de 372%.
Dos 9135 hectares totais desmatados no RN em 2023, a maior parte é devido à agropecuária. Além da Caatinga, o estudo também verificou desmatamento na área de Mata Atlântica localizada no estado.
“Caminhando para ser campeão no desmatamento da Caatinga”
Levando em consideração a Caatinga como um todo, o desmatamento no bioma para empreendimentos de energia eólica e solar atingiu 4.302 hectares no ano de 2023, um aumento percentual de 24% se comparada ao ano anterior. A Caatinga é o bioma mais afetado pelas renováveis, mostra o relatório.
Na Caatinga, a Bahia lidera o desmatamento em geral, com 93.437 hectares – um aumento de 34% em relação a 2022.
Mas, considerando o número de desmatamento causado exclusivamente por empreendimentos de energias renováveis na Caatinga, o Rio Grande do Norte fica em primeiro lugar.
Logo atrás, vem:
Piauí – 1031,3 ha
Ceará – 948,6 ha
Bahia – 799,3 ha
Paraíba – 107,8 ha
Pernambuco – 45,6 ha
Considerando demais causas do desmatamento, a área desmatada na Caatinga em 2023 foi de 201.687 hectares, um aumento percentual de mais de 43%, se comparado a 2022, quando foi desmatada uma área de 140.635 hectares na região.
Os dados da pesquisa atestam as denúncias da sociedade acerca dos impactos socioambientais das energias renováveis. As mobilizações têm sido realizadas por coletivos como o grupo Seridó Vivo, além de agricultores, pescadores e moradores de regiões próximas aos parques eólicos.
Rani Sousa é integrante do Seridó Vivo. Para ela, é uma contradição que as energias renováveis se apresentem como sustentáveis e limpas mas, na prática, acelerem o desmatamento na Caatinga.
“E desmatamento numa área de um bioma único, extremamente importante, e onde já se tem o processo de desertificação. Há muitos anos já ocorre a preocupação da desertificação no Semiárido. E aí você traz uma atividade que se diz sustentável, e ela piora ainda mais essa desertificação, trazendo consequências para a população e para a biodiversidade”, pontua.
E o problema é ainda maior, ressalta Sousa. Ela explica que preservar a Caatinga é importante até mesmo para reduzir o gás carbônico na atmosfera, com o intuito de combater o aquecimento global.
“A Caatinga é muito poderosa no processo de descarbonização, por ela ter uma capacidade de retenção do gás carbônico ainda melhor do que a floresta amazônica, por exemplo. Então a gente precisa ver a Caatinga como um meio de atingir esse processo de descarbonização, que é tão almejado e inclusive um dos argumentos das usinas de energia eólica e fotovoltaica. E a maneira de fazer isso é preservar e também investir no reflorestamento das áreas degradadas”, defende.
“As áreas mais preservadas de Caatinga são alvo principal desses empreendimentos [renováveis], principalmente porque elas estão em áreas de topos de Serras, que têm os melhores ventos e onde tem a Caatinga mais preservada. E é um modelo que precisa ser visto com urgência”, explica Sousa.“O Rio Grande do Norte se orgulha em ser o campeão na produção de energia eólica. E está caminhando para ser o campeão no desmatamento da Caatinga”, complementa.
Em 2023, o desmatamento no país caiu 11,6%. Amazônia e Cerrado representaram mais de 85% da área total desmatada no país.